Esquecer o cartão ou não ter dinheiro deixou de ser desculpa para evitar comprar algo — pelo menos, na C&A. A varejista passou a permitir que clientes paguem nas lojas físicas apenas informando o número do CPF, mostrando o próprio rosto e digitando uma senha.
A partir de agosto, não será preciso informar o código secreto. Bastará mostrar a cara, o documento e pronto. Tilt testou na prática a nova ferramenta para entender como o sistema funciona. Sob a roupagem tecnológica, a estratégia da empresa holandesa é, de uma vez só, reduzir fraudes e difundir seu cartão de crédito digital que cobra juros acima dos praticados pelo mercado.
Como funciona
O sistema começou a funcionar em maio nas 334 lojas da varejista. Isso faz da C&A a maior varejista a usar reconhecimento facial no pagamento – dona de 15 megalojas e 168 filiais, a Havan já possui o serviço; a Renner também tem experimentado em algumas lojas. Para se preparar, a empresa holandesa instalou câmeras em todas elas em outubro de 2022. Entre cadastro e efetuação da compra, foram 5 minutos:
* Como o pagamento com biometria facial vale apenas para cadastrados no C&A Pay, um cartão virtual da rede lançado em dezembro de 2021, tive que fazer um;
* Precisei de um documento de identificação, e-mail e um smartphone;
* Eu fiz na loja, onde um atendente tirou uma foto minha, mas é possível realizar o procedimento por meio do app de mesmo nome;
* Ainda que já tenha sido fotografado presencialmente, a configuração do app exige uma captação do rosto para fins de reconhecimento facial;
* A C&A usa tecnologia da Único, uma empresa de gestão de identidade digital que checa se a imagem informada pela pessoa consta em alguns dos seus bancos de dados. Com a autenticação feita, a varejista analisa a pontuação de crédito e libera um limite para uso do cartão de crédito digital;
* Com o cadastro feito, parti para a compra de um pacote de meias. Informei meus dados, digitei a senha cadastrada, meu rosto apareceu no monitor da atendente e a compra foi efetuada. Essa última etapa levou menos de 2 minutos.
Fonte: Imagem: Guilherme Tagiaroli/Tilt – Ao fazer compra com o C&A Pay, vendedora valida se o cliente é ele mesmo a partir de uma foto.
Comum em sistemas de abertura de conta em bancos digitais, o reconhecimento facial não é usual no varejo, muito menos em lojas físicas, explica Carlos Carvalho, que é associado da consultoria de varejo Gouvêa e CEO e cofundador da Truppe!.
Para o especialista, a implantação da biometria facial foi feita para reduzir golpes. “Altos custos com fraudes e demonstrar mais segurança e confiabilidade nos processos para os clientes foram os principais fatos geradores da mudança tecnológica.”
A empresa varejista confirma que a intenção era essa e até descreve que tipos de ações tentou evitar. Segundo Levi Fonseca, diretor executivo do C&A Pay, o uso de reconhecimento facial no cadastro e a checagem adicional feita no caixa ajuda a coibir dois tipos de fraude:
* Falsidade ideológica: quando alguém se passar por você, gerando um cartão com seus dados, faz compras com ele e a conta vai para o seu nome;
* Invasões de conta: quando cartão e identidade são legítimos, mas ambos foram sequestrados por algum bandido que passa a usá-los em nome do dono.
Ao detectar algum tipo de atividade suspeita, mesmo em compra online feita com o C&A Pay, o sistema solicita uma nova verificação do rosto para assegurar se é você, de fato, quem está fazendo a operação.
“Nossa ideia é tirar a senha em agosto, e a compra ser feita apenas informando documento e operar só na face. A senha só deve ser usada em situação de atividade suspeita ou eventualmente quando tiver alguma indisponibilidade de sistema.”
Levi Fonseca, diretor-executivo do C&A Pay
O uso de biometria facial virou um recurso para evitar prejuízos decorrentes de fraudes. Segunda a Serasa Experian, que vende ferramentas de certificação de identidade, o reconhecimento facial evitou um rombo de R$ 29 bilhões entre outubro de 2022 e março de 2023. As maiores impactadas seriam varejistas, empresas do setor financeiro e companhias de telecomunicação.
Vale a pena?
Além de segurança, a C&A afirma que quer fornecer uma experiência mais ágil de compra. Isso porque os clientes do C&A Pay compram apenas informando CPF, digitando uma senha cadastrada e sendo alvo de um “cara crachá” da atendente.
O sistema de cartão de crédito digital, porém, é peça central na estratégia. Ainda que não tenha anuidade ou qualquer tipo de gasto para afiliação, é por meio dele que os clientes administram seus gastos na loja e geram a fatura para pagá-los.
A C&A fornece benefícios a quem adquiri-lo, como fila expressa, caixa para presente, possibilidade de entrar com até 18 peças no provador e descontos no mês de aniversário e em determinadas peças.
Porém, é na hora do pagamento que a conta pode sair salgada. Os juros do rotativo, aquele que você paga quando deixa de sanar o total da fatura, cobrados pelo C&A são de 18,99% ao mês, acima dos praticados por bancos privados (entre 13% e 15%).
De todo modo, a novidade é algo que deve ser implantada por outras redes. Mas lentamente.
“Acredito que isso ainda vai demorar uns 4 ou 5 anos, pelo menos, para ser implementado de forma abrangente no Brasil, pois a tecnologia ainda é cara para nossa realidade e ainda precisa de mais maturidade tecnológica no varejo.”
Carlos Carvalho, associado da consultoria de varejo Gouvêa.
Fonte:
https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2023/07/05/compra-reconhecimento-facial-ca.htm